Meditações
Apesar de tudo: como lidar com quem inferniza sua vida
É tão fácil odiar os pecados e erros dos outros, mas quando olhamos para nós mesmos, descobrimos que somos piores do que imaginávamos.
Estou escrevendo este post mais como um desabafo do que por qualquer outra razão. Se você conhece alguém que faz da sua vida um inferno, vai me entender, pois há um irmão em Cristo que me atormenta e preciso pôr para fora a minha ira – que é santa, naturalmente – senão parece que vou explodir.
É muito duro para nós, que somos santos e irrepreensíveis, aturar esse tipo de gente falível. Pode ser que a pessoa que você não suporte seja um vizinho que ponha músicas horríveis no maior volume sempre que você quer dormir. Ou um colega de trabalho que minta contra você. Ou, ainda, uma irmã da igreja que te irrita, magoa ou toma atitudes contra sua paz. Pode ser, até mesmo, o seu chefe, quem sabe, ou o pastor que, em vez de zelar por tua alma, te oprime, subjuga, denigre e prejudica. E você odeia tudo de ruim que há nessa pessoa. Quer fazer parecer que não, pois, afinal, odiar não pega bem para um crente. Mas, lá no fundo do coração, você sabe que odeia. Talvez não tão no fundo assim.
Pois bem, há um cara que me tira do sério. Sou obrigado a conviver com ele por causa das circunstâncias da vida, mas ele é chato, pecador, egoísta, mesquinho e insuportável – tudo o que eu não sou. Por favor, permita-me desabafar.
Conheço esse cara desde a infância. As primeiras lembranças que tenho dele são anteriores aos meus 3 anos de idade, pois morávamos na mesma rua. Anos e anos e anos suportando esse cidadão. Crescemos juntos e, por uma série de situações, que não vêm ao caso, fui obrigado a conviver com ele em muitas áreas de minha vida. Hoje, inclusive, ele calhou de frequentar a mesma igreja que eu – para meu azar e irritação.
Uma das coisas que mais me incomodam nele é que E. (permita-me chamá-lo apenas pela inicial) se faz passar por meu amigo e tem toda a aparência de crente, mas é um tremendo pecador. Como o conheço há tanto tempo, temos intimidade suficiente para eu saber coisas de sua vida que ninguém mais sabe. Ele me conta pensamentos terríveis e atos completamente reprováveis do ponto de vista bíblico. Às, vezes, confesso, chego a ter uma certa repulsa por E., tamanha é a sua pecaminosidade. E é duro para uma pessoa tão correta como eu aguentar isso. Mas, infelizmente, sou obrigado a conviver com ele, então não tenho para onde correr.
Eu me encontro com ele nos cultos. O vejo levantar as mãos no louvor, fazer aquela carinha de santo na hora da oração e ostentar seu jeito insuportável de cristão nota dez, quando eu sei quem ele é e as coisas horríveis que pensa e faz. Na verdade, eu o fico observando o culto inteiro e me enoja quando ele fica chorando, pedindo perdão por seus pecados, quando sei que ele vai sair da igreja e pecar de novo. E me sinto obrigado a pedir que Deus pese a mão sobre ele, pra ver se toma jeito. Miserável pecador…
Você conhece alguém assim? Por favor, me diga como devo proceder. Às vezes, quando prego, confesso que já exortei muito pensando nele, pois sabia que ele estava ouvindo. Sabe quando você faz uma explanação que parece generalista mas tem endereço certo? Você pode até achar feio eu ter feito isso, mas confesso: eu fiz. Dei montes de indiretas para E. em muitas de minhas pregações, para ver se ele, de algum modo, era tocado por Deus e mudava. Não sei se adiantou, só o Senhor sabe, mas fiz a minha parte.
Pense em apenas alguns dos dez mandamentos. E. muitas e muitas vezes priorizou outras coisas no lugar de Deus. Honrar pai e mãe? Coitados, lembro que, quando éramos crianças, ele dava um trabalhão. “Não dirás falso testemunho contra o teu próximo”? Como negar as montanhas de vezes em que ele fez isso? “Não cobiçarás a casa do teu próximo. Não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma que pertença ao teu próximo”? Tudo bem, admito, nunca o vi cobiçar o jumento de ninguém, de resto perdi a conta de quantas vezes o flagrei invejando o que não lhe pertencia. Cara, desculpe, mas E. tem tantos buracos em sua santidade…
Você tem algum E. na sua vida? Pense aí. Lembrou de alguém intragável, que parece só ter vindo ao mundo para te irritar, chatear, fazer chorar? É que realmente as circunstâncias não permitem, mas por mim eu mandava exilar E. no Tibete. Sabe o que mais me tira do sério? Ele até fala uma ou outra coisa legal, por isso tem gente que o elogia, que o acha alguém especial. Desculpem, mas eu conheço bem esse cara. Se duvidar, uns 95% dos elogios que ele recebe são imerecidos. E. precisa desesperadamente do perdão de Deus, pois tem muitas e muitas coisas a melhorar. Já falei isso a ele. Mas parece que, na maioria das vezes, o cidadão não me ouve!
Bem, acho que já desabafei o suficiente. Eu odeio tudo o que E. tem de ruim. Odeio. Odeio sua pecaminosidade, o fato de ele fazer menos do que poderia pelo próximo, odeio quando não pede perdão pelos seus pecados, odeio suas fraquezas. Ele me tira do sério.
Mas… tem uma coisa. Apesar de tudo isso, eu sei que Jesus o ama.
A despeito de seus defeitos, suas falhas, seus pecados, sua omissão, tudo, tudo, tudo o que faz de E. uma pessoa odiosa… Jesus o ama. Não entendo todo esse amor por um zero à esquerda como ele, asseguro que não entendo. Mas sei que isso tem um nome: graça. E. não vale nada, mas a graça o faz valer o mundo para Deus. Foi por esse cidadão que o Cordeiro de Deus subiu à cruz, foi moído, rasgado, cuspido, ofendido, morto. E eu acredito que, porque a salvação é pela graça e não por mérito, um dia ele irá para o céu. Graça. Esse é o segredo. Essa é a explicação. Essa é a esperança. Essa é a certeza. Essa é a fé. Pois a graça não faz Deus ver toda a sujeira que E. carrega em si quando olha para ele. Quando o Pai fita seu olhar em E., o que ele enxerga é o Cordeiro que foi imolado por cada um dos seus pecados.
Conheço bem E. Ele habita dentro de mim. E., de Eu. Sim… o nome de E. é Maurício Zágari.
Obrigado, Senhor, por não me ver como eu sou, mas como Jesus é.
Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Maurício Zágari